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05 novembro 2021

ProSucesso

 

ProSucesso

Há silêncios ensurdecedores!

        A Região Autónoma dos Açores continua a ser uma das regiões mais pobres e menos desenvolvidas de Portugal e da Europa. Todos os indicadores e estudos apontam para este facto. De igual modo, todas as soluções para resolver esta fragilidade, na opinião de todos, coisa rara, referem o pilar da Educação como a única ferramenta que pode colmatar esta realidade.

Em 2015, indo ao encontro deste problema, foi implementado nas escolas da região o Plano Integrado de Promoção do Sucesso Escolar - ProSucesso.

Foi um projeto que, estranhamente, não obteve, no contexto dos partidos políticos, grande objeção nem críticas. Até agora!

As recentes eleições criaram uma nova realidade política. Os novos governos precisam de encontrar, no passado recente, falhas e erros para não poderem, de imediato, fazer mais, melhor e diferente!

Ao longo dos anos os relatórios e as análises efetuados à implementação do ProSucesso, mostravam melhorias nas taxas globais de progressão e um recuo nos indicadores de retenção dos alunos. O objetivo final era reduzir as taxas de abandono escolar precoce, pois apresentávamos as maiores taxas a nível nacional, e acabar com o flagelo dos “nem-nem”!

Mas havia que verificar, através de uma comissão de avaliação externa (C.A.E), a validade destes resultados. Assim, em março de 2021, foi contratualizada com uma equipa de docentes do Departamento de Matemática da Universidade dos Açores, liderada pelo professor associado João Cabral, a avaliação externa do ProSucesso, por 13.000 euros. Estranhamente, ou não, nesta equipa não houve espaço para nenhum doutorado em estatística do referido departamento! Não queriam certamente que este relatório se limitasse a «lançar gráficos informativos, “bombeando descrições de leituras” quase diretas.».

Deste modo, foi adaptado à realização deste relatório um modelo Fuzzy, o modelo 𝜓 (psi). Este modelo foi usado anteriormente, pela consulta de alguns trabalhos, nas áreas do turismo e gestão.

Na educação foi a primeira vez que o modelo 𝜓 foi aplicado. De facto, é um modelo recente, desenvolvido por um dos elementos da C.A.E., que ainda não obteve grande validação pela comunidade científica da área. 

Sendo esta a primeira vez que este projeto iria ser alvo de uma avaliação externa, deveriam ter sido utilizadas, pela S.R.E., na minha opinião, ferramentas que já tivessem sido validadas em contextos semelhantes.

Para além da aplicação do modelo 𝜓,  a comissão iria, ainda, basear-se: “i) na consulta de toda a documentação, não relatora, disponibilizada pela SRE relativa ao ProSucesso; ii) na análise detalhada, usando a metodologia Fuzzy, de todos os relatórios já existentes; iii) na análise dos resultados de um construtor preenchido por todos os docentes das escolas da Região Autónoma dos Açores; iv) em informações adicionais prestadas, por consulta da CAE, à Comissão Coordenadora do ProSucesso; v) em recolha de informação direta, através de contactos com grupos de professores e escolas; vi) em contactos com grupos de alunos, pais e encarregados de educação; vii) no preenchimento de um construtor pelos professores das escolas da Região Autónoma da Madeira, para servir de grupo de controlo, e de certa forma validar de forma mais eficiente, e célere, toda a informação que seria analisada pelo construtor que fora submetido nos Açores.”

  Mas a C.A.E. não conseguiu cumprir este plano de trabalho. Assim, começam aqui, no meu entender, as fragilidades deste relatório.

A primeira falha é, sem dúvida, a pressa e o pouco tempo dedicado a este estudo. A C.A.E. tem consciência disso, refere-o várias vezes.

Ainda no campo do diagnóstico, e num espírito de consulta de todos os intervenientes na educação nos Açores, por que não foram ouvidos o Conselho Científico do ProSucesso (teriam facilmente justificado cientificamente a criação deste projeto), a Comissão Permanente do Ensino Público, o Conselho Coordenador do Sistema Educativo e a Inspeção Regional da Educação?

 Mas a pressa e a falta da testagem do modelo trouxeram outras lacunas bastante graves, no meu entender. Dos sete pressupostos que eram a base de construção do relatório, os três últimos não foram desenvolvidos, a saber: contacto direto com professores, alunos, pais/encarregados de educação e a criação de um grupo de controlo. Este último, para testar e validar a adaptação do modelo 𝜓 à Educação. Com esse objetivo foram encetados contactos com a Região Autónoma da Madeira. Este grupo de controlo nunca foi criado devido às “falhas de comunicação entre a Direção Regional de Educação da Madeira e as escolas.” Mas rapidamente o modelo 𝜓 foi corrigido e adaptado para colmatar a falta de contacto direto com os alunos, pais, professores e a inexistência de um grupo de controlo.

Umas das críticas da C.A.E. aos relatórios do ProSucesso é «A não exploração, de forma mais assertiva da secção “A voz dos alunos”, podendo-se ter implementado também a “voz do professor” e a “voz do encarregado de educação”». Provavelmente, os relatórios do ProSucesso não foram assertivos na voz dos alunos e dos encarregados de educação, mas o relatório da C.A.E. foi completamente omisso em ouvir estes intervenientes! Recomenda, mas não faz!  

Mesmo com estas falhas e omissões, temos um relatório que afirma de forma categórica que os bons resultados obtidos nos últimos anos teriam existido na mesma sem o ProSucesso! E sem a existência de um grupo de controlo!

Desde quando se criam construtores/inquéritos que vão avaliar o trabalho de milhares de professores nos últimos anos nos Açores sem serem testados primeiro e haver um grupo de controlo?! Nos Açores.

Os projetos são os seus resultados, ou pelo menos deveriam ser. Não nos Açores! Somos mesmo extraordinários! Quando temos indicadores positivos que podem servir de motivação e de exemplo numa área crítica do desenvolvimento regional, a Educação, vamos a correr criar uma comissão que anule, descredibilize e confunda esses resultados.

Em Educação não existem projetos perfeitos, existem dinâmicas melhoradas no seu dia a dia. Se o ProSucesso é um projeto perfeito? Claro que não, nem nunca teve essa pretensão. Com este, ou outro nome, a região tem de ter ambição e desenvolver dinâmicas que motivem os alunos para o conhecimento e evitem o abandono escolar. Isto só se consegue com pedagogias ativas e com muita formação e acompanhamento dos professores e das escolas.  

Uma das falhas, mais uma, no meu entender, deste relatório é o número de docentes que responderam aos inquéritos, construtores, e a maneira como se validou a amostragem efetuada.

Os relatores partiram de um valor de referência para o universo mínimo de 4.400 docentes. A título informativo, no ano letivo 2019/2020, lecionaram na região 4.991 docentes e educadores de infância. Com este valor de referência, 4.400, e com um valor médio, aos três descritores/inquéritos, de 500 respostas, a C.A.E. estima uma ordem de participação de 18% a 20%! No meu entender, um valor extremamente baixo para se poderem tirar conclusões inequívocas.  Não terá havido uma extrapolação um tanto forçada dos resultados e conclusões?

Algumas das razões por que os docentes não participaram e colaboraram no preenchimento dos inquéritos foi porque muitos professores não os perceberam, por estarem no final de um ano letivo e por alguns terem dúvidas em relação ao anonimato dos mesmos, já que era solicitada a identificação da escola, grupo de lecionação e idade!

Durante a leitura do documento ficamos confusos com algumas afirmações que nos levam a duvidar das conclusões apresentadas, por exemplo: «Pelas informações que a CAE conseguiu recolher, por aquilo que é mencionado em todos os relatórios, apesar de haver um ou outro registo resultante de um orgulho exacerbado, é aceitável dizer e concordamos, de forma geral, com a apreciação da Avaliação Interna que foi sendo feita. As dinâmicas, após o quarto ano de implementação do ProSucesso, já decorriam de uma forma fluida e consistente, existindo uma perceção dos processos bastante elevada por parte dos membros da comunidade educativa.»

Mais, se a C.A.E. considera que o «período temporal ainda é muito curto para se comprovar a correlação positivada da evolução» dos resultados com o ProSucesso, como pode considerar que não é o suficiente para concluir que não «houve sucesso com o ProSucesso»?

Em relação aos Prof DA de matemática, no 1.º ciclo, o trabalho desenvolvido foi extraordinário e em muito deve orgulhar os Açores. Muito mais haveria a dizer, mas fica para uma próxima oportunidade. Pode ser que o silêncio se quebre!

Referir que, no 3.º ciclo, não existiu acompanhamento científico é uma enorme desrespeito e de reconhecimento do trabalho desenvolvido pelas docentes Nélia Amado e Susana Carreira da Universidade do Algarve. São uma referência ao nível nacional na didática da matemática.

Tendo em conta estas falhas e omissões, tenho de concordar com esta comissão quando diz: «O relatório não é perfeito», muito longe disso.

No entanto, este trabalho deve ser apresentado nas escolas e discutido nos seus órgãos. Levanta algumas questões que devem ser analisadas e ponderadas em termos de dinâmica de projeto. Para isso o relatório deve chegar a todos os professores. Muitos só o conhecem do resumo da comunicação social, ainda não o receberam. Tirar conclusões pela cabeça dos outros, é sempre perigoso.

Em conclusão, a pressa e a ânsia de apresentar o resultado, a proximidade com muitos protagonistas do projeto na Universidade dos Açores, a aplicação de um modelo experimental não testado na Educação, algum «orgulho exacerbado» e a falta de diálogo, efetiva, com todos os protagonistas do ProSucesso, fazem deste relatório um documento que deve ser analisado e interpretado com algum cuidado.

Mas claro, esta é a minha opinião!





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